“Mariam tinha cinco anos quando ouviu pela primeira vez a palavra harami.”
Aos 5 anos, a mãe chamou-a bastarda. Aos 15, foi forçada a casar com um viúvo. 20 anos depois, Mariam conhece Laila e formam uma ligação improvável, sob o regime autoritário dos Talibã.
Li este livro quando vivia em Maastricht, já há muito tempo. Sei precisamente como me senti a lê-lo, porque foi, até agora, o único livro que me deixou tão frustrada e impotente que o atirei contra a parede do quarto. O livro não ficou com mazelas, como podem ver na foto. Não posso dizer o mesmo de mim.
Já estudava relações internacionais e achava que tinha um conhecimento razoável sobre o que se passava no mundo. Aprendi muito mais desde essa época (até tive oportunidade de trabalhar brevemente num projecto sobre o Afeganistão), mas este foi o primeiro livro que me lembro de me ter provocado uma raiva tão grande sobre a injustiça e a crueldade. Infelizmente, 16 anos passados, a situação no Afeganistão está consideravelmente pior.
“Apesar dos momentos de beleza, Mariam sabia que a vida tinha sido injusta para ela.”
A injustiça, na altura e agora, é constante. Sim, os afegãos têm uma cultura diferente; sim, a situação no país é complexa, como qualquer tema geopolítico. Qualquer invasão e tentativa forçada de impor valores democráticos estará condenada ao falhanço. A negociação e a diplomacia são as melhores vias. No entanto, sempre me pareceu hipócrita defender o “segundo olhar” que alguns cronistas portugueses recomendavam logo a seguir à tomada de Cabul pelos Talibãs (em 2022). O tempo mostrou-nos que a situação piorou, que a desinformação continua elevada, e que já poucos se lembram do Afeganistão.
A história de Mariam e de Laila é de injustiça, mas o livro é muito mais do que isso. A esperança, o heroísmo, e o amor são muito mais importantes. Não me arrependo da minha explosão de raiva, mas teria perdido bastante se não tivesse retomado a leitura.
“Laila seguiu em frente. No fundo, sabe que é tudo o que pode fazer. Isso e esperança.”